segunda-feira, 8 de outubro de 2007

Deu na Folha..isso que é clássico de verdade...


Crítica/"Taxi Driver"

Clássico de Scorsese é ponto alto de época ousada

"Taxi Driver" (1976) retorna em DVD com dois discos, recheados de extras

SÉRGIO RIZZO
CRÍTICO DA FOLHA

Pequenos caprichos do destino, aliados a opções que foram depois abandonadas, poderiam ter feito de "Taxi Driver" um filme dirigido por Brian De Palma, com Dustin Hoffman no papel de Travis Bickle. Nesse mundo paralelo, ele talvez fosse realizado em vídeo, em preto-e-branco e fora de Nova York.
De Palma foi quem primeiro recebeu o roteiro de Paul Schrader para que examinasse a possibilidade de filmá-lo, mas julgou que o argumento era mais adequado a Martin Scorsese. Em diferentes estágios do projeto, cogitou-se adaptá-lo aos escassos recursos disponíveis para torná-lo viável.
Por fim, um orçamento (modesto) de US$ 2 milhões, Robert De Niro, película colorida e as ruas da perigosa Nova York de meados dos anos 70 fizeram com que "Taxi Driver" encontrasse o seu caminho como um clássico da "nova Hollywood", agora relançado em DVD, em "edição definitiva" com dois discos e muitos extras.
De notável valor arqueológico, esse material proporciona uma expedição a um dos momentos mais férteis de ousadia e inventividade no cinema norte-americano, detonado no final dos anos 60 com a tomada do poder, no coração da indústria, por uma nova geração de diretores, produtores, técnicos e atores.
De "Sem Destino" (1968) a "Touro Indomável" (1980), usando os marcos inicial e final adotados pelo jornalista Peter Biskind para reconstituir o período no livro-reportagem "Easy Riders, Raging Bulls", foram anos de feliz sintonia com as expectativas do público que havia se tornado adulto na década de 60, sob a influência da contracultura, da revolução sexual e da Guerra do Vietnã.
"Taxi Driver" é uma das mais bem-sucedidas expressões desse ambiente favorável à experimentação, desde a escolha incomum de argumento a solidão e a violência urbanas nos EUA sob a perspectiva de um insone ex-combatente no Vietnã até a vitalidade estilística (com o risco assumido do exagero) eleita para dar conta dele.
De acordo com os depoimentos detalhados de Scorsese nos mini-documentários que acompanham o filme, suas principais referências -meramente "inspiracionais" ou fornecedoras de parâmetros estéticos- foram o franco-suíço Jean-Luc Godard, o alemão Rainer Werner Fassbinder, o italiano Francesco Rosi e o inglês Alfred Hitchcock.
Os extras reúnem também entrevistas com Schrader, o produtor Michael Phillips, o diretor de fotografia Michael Chapman, De Niro e colegas de elenco, como Jodie Foster, Cybill Shepherd e Albert Brooks, além de convidados como o cineasta Oliver Stone e o crítico Robert Kolker, autor de um livro seminal ("A Cinema of Loneliness") sobre a solidão no cinema norte-americano dos anos 60 e 70.
Para contrabalançar a saudade daqueles tempos inquietos e de seus filmes notáveis, sobretudo se comparados à Hollywood de hoje, ex-taxistas de Nova York dão seus depoimentos. "Bickle não estava errado", diz um deles. "A cidade era o inferno de Dante."


TAXI DRIVER
Direção:
Martin Scorsese
Distribuidora: Sony (R$ 30)
Avaliação: ótimo

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